As barragens e os rios em Portugal

by | Nov 21, 2023

Atualmente, os ecossistemas relacionados com os rios portugueses estão já muito afetados pela construção desmesurada de barragens. Neste momento, embora a pressão para construção de barragens com fins hidroelétricos seja quase nula, assiste-se a uma grande aposta no regadio, e consequentemente na construção de barragens cujo fim principal é o regadio. O investimento em restauro ecológico de rios é pouquíssimo, e as estratégias para mitigação das alterações climáticas no âmbito da gestão dos recursos hídricos são no mínimo pouco claras, e por vezes até contraditórias. Neste momento Portugal enfrenta grandes desafios na gestão dos seus ecossistemas de água doce, entre elas a aposta em soluções alternativas às barragens para armazenamento de água (criação de paisagens de retenção de água e aposta em sistemas agroalimentares mais sustentáveis); a promoção de um programa de remoção sistemática de barragens e outras barreiras obsoletas dos nossos rios (à semelhança do que se faz em outros países); e a aposta em soluções de restauro ecológico que nos permitam cumprir a Estratégia Nacional de Conservação da Natureza e Biodiversidade 2030.

Atualmente, existem mais de 8000 barreiras (desde grandes barragens a barreiras de pequenas dimensões) identificadas de norte a sul do país, o que é algo extremamente preocupante, uma vez que afeta grandemente os habitats ribeirinhos, quebra o normal ciclo do rio e coloca em risco a continuidade de dezenas de espécies selvagens, algumas delas com um elevado risco de extinção, tais como o mexilhão-de-rio, a lampreia, salmão e a enguia. A acrescer a este facto, muitas destas barreiras são obsoletas, já não têm qualquer função e são passíveis de remoção, mas esta não é promovida pelo nosso governo.

Contrariar este ciclo de destruição dos habitats e da biodiversidade passa pela melhoria dos mecanismos legislativos de forma que estes melhor promovam a proteção dos rios, que são bens únicos e essenciais para a qualidade de vida humana, assim como para a sobrevivência de inúmeras outras espécies. Neste momento o GEOTA tem uma iniciativa legislativa de cidadãos em curso, para a qual precisamos de 20 mil assinaturas, para que a nossa proposta de lei com o fim de proteger os ecossistemas de água doce em Portugal seja levada à Assembleia da República.

Neste momento Portugal está sob uma imensa pressão para construção de barragens cujo principal fim é o regadio. O argumento é de que precisamos de construir reservatórios de água para fazer face aos efeitos das alterações climáticas – mas isto é uma falácia. Primeiro que tudo as alterações climáticas derivam do efeito do Homem, e é do consenso geral que devem ser combatidas através da regeneração dos ecossistemas, e através de um travão às ações destrutivas que temos sobre o ambiente, seja em termos de construção, seja em termos de produção, seja em termos de consumo. Construir uma barragem implica inevitavelmente uma destruição de um habitat, e é prejudicial às espécies que dele dependiam. Em segundo lugar os reservatórios de água criados pelas barragens para regadio alimentam uma agroindústria que usualmente usa de forma abusiva o recurso água – em Portugal cerca de 75% da água é usada pelo setor agrícola, e o desperdício de água pelo setor é da ordem dos 40%. Finalmente, o modelo agrícola usado em Portugal neste momento não é a forma indicada de agricultura para combater as alterações climáticas. A própria estratégia Farm to Fork (do prado ao prato), componente fundamental do Pacto Ecológico Europeu, promove uma rápida transição para um sistema alimentar sustentável, com impactos ambientais neutros ou positivos, que ajuda a combater as alterações climáticas e a mitigar os seus efeitos e reverter as perdas de biodiversidade. Após uma construção desmesurada de barragens para energia hidroelétrica em Portugal na última década, não existe agora muita pressão nesse sentido. No entanto, é essencial também que se compreenda que existem estratégias energéticas alternativas, que não implicam a destruição dos nossos rios e que embira a energia hidroelétrica seja considerada renovável, é uma energia que acarreta graves impactos ambientais.

 

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